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EPISÓDIO # 29 - ESPIRITISMO, CANDOMBLÉ E UMBANDA

  • Foto do escritor: Carlos A. Biella
    Carlos A. Biella
  • 2 de dez. de 2021
  • 1 min de leitura

Atualizado: 23 de jul. de 2023


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Espiritismo, candomblé e umbanda.


Existe alguma diferença entre Espiritismo, Candomblé e Umbanda? E semelhanças? Então toquem seus atabaques e tambores, pois será sobre isso que falaremos hoje. Sejam todos muito bem-vindos e aproveitem.

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Saudações a todos. Este é o podcast Mundo Espiritual. Eu sou Carlos Biella e a produção, edição e a apresentação são minhas. A arte das capas dos episódios é feita pelo Gustavo Crispim. Ouça ou baixe o podcast, confira o conteúdo do episódio e entre em contato conosco. Confira os endereços na transcrição do episódio (https://podcastmundoespiritual.blogspot.com/ e http://mundoespiritual.podcloud.site/). Estamos também no Facebook (https://www.facebook.com/podcastmundoespiritual), Youtube (https://www.youtube.com/channel/UCvE-E-zthITBCsrNNJa0ytw) e Instagram (https://www.instagram.com/podcastmundoespiritual/). Procure-nos, também, nas diversas plataformas players de podcast. Este é seu podcast Mundo Espiritual Existe é muita confusão a respeito destas três vertentes da corrente que chamamos espiritista ou espiritualista. Em alguns artigos e livros que pesquisei para a elaboração deste episódio, percebi que, de um modo bastante geral, compreende-se como espiritista ou espiritualista, a crença nos espíritos e a interação deles com os vivos. Muitas pessoas são denominadas ou consideram a si mesmas como Espírita kardecista, para distingui-lo de outros espiritualistas como os adeptos da Umbanda e do Candomblé. Mas, ao meu entender, esse termo kardecista não deveria ser utilizado, uma vez que o termo espirita foi criado pelo próprio Allan Kardec, ou seja, Espírita kardecista seria uma redundância. E hoje eu vou fazer o episódio um pouco diferente, pois não irei falar das músicas que serão apresentadas. No decorrer do episódio estaremos ouvindo várias canções, cantigas e pontos cantados, que são usados nas práticas do Candomblé e da Umbanda. Então, apreciem tudo, sem nenhuma intolerância. De acordo com o último Censo do IBGE, de 2010, teríamos no Brasil uma população de pouco mais de 3.8 milhões de Espíritas, cerca de 167 mil seguidores do Candomblé e pouco mais de 407 mil seguidores da Umbanda. Ou seja, teríamos 2% da população brasileira sendo espírita, 0,2% de e 0,01% de seguidores da Umbanda seguidores do Candomblé. Uma população bem pequena, de acordo com os dados oficiais do Censo. Mas, sabemos que muitos seguidores destas três vertentes, são declaradamente de outras religiões, mas que buscam as práticas espiritualistas, frequentando Casas Espíritas e Terreiros de Umbanda e Candomblé. Bem, não pretendo aqui, destrinchar e ir a fundo sobre as três vertentes, mas vou trazer algumas informações que servirão para diferenciar e também mostrar as semelhanças existentes entre elas. Inclusive, se você não é seguidor de nenhuma das três vertentes aqui representadas, este episódio pode te ajudar a entender um pouco sobre o assunto. De uma forma resumida, podemos dizer que o Espiritismo seja, como disse seu criador, uma doutrina que mescla filosofia, ciência e religião. Origina-se na França, no século XIX e foi codificado por um professor francês, que usou o pseudônimo de Allan Kardec em suas publicações. O Candomblé seria uma religião originaria da África, que cultua os orixás, que são divindades agentes do deus supremo criador do universo, Olorum, além de outras divindades africanas e foi trazida ao Brasil por escravos. Já a Umbanda é considerada a mais genuína religião brasileira, trazendo traços do Candomblé, mas fortemente marcada por cultos indígenas brasileiros, pelo catolicismo e pelo próprio Espiritismo. O Espiritismo é a doutrina revelada pelos Espíritos Superiores, através de médiuns (os intermediários entre o mundo dos vivos e dos mortos), e organizada (ou codificada), no século XIX, por um educador francês, Hippolyte Léon Denizard Rivail, conhecido por Allan Kardec, que reuniu comunicações, estudou-as, pesquisou e colocou o resultado deste trabalho em livros. Nestes livros, conhecidos como Obras Básicas ou Codificação Espírita, encontram-se os fundamentos da Doutrina Espírita e são eles, O Livro dos Espíritos, de 1857, O Livro dos Médiuns, de 1861, O Evangelho Segundo o Espiritismo, de 1864, O Céu e o Inferno, de 1865 e A Gênese, de 1868. Ao contrário do que alguns consideram, o Espiritismo é uma doutrina cristã, pois segue os ensinamentos de Jesus, considerado o modelo de perfeição moral para ser seguido e copiado. O Espiritismo, como disse o próprio Kardec, é, ao mesmo tempo, Ciência, Filosofia e Religião. Como Ciência, estuda os fenômenos mediúnicos e as relações que se podem estabelecer com os Espíritos, ensinando a necessidade de se ter uma fé raciocinada. Como Filosofia, ensina noções mais aprofundadas a respeito de Deus, do Universo, dos Homens, dos Espíritos e das Leis que regem a vida. Ensina o que somos, de onde viemos, para onde vamos, qual o objetivo de nossa existência e qual a razão da dor e do sofrimento. Também é religião, pois compreende as consequências morais decorrentes de tais ensinamentos, objetivando um reencontro ou uma religação do homem com Deus, estabelecendo, como princípio maior, que “Fora da Caridade não há salvação”. Assim, o Espiritismo é uma doutrina filosófica que se define por um conjunto de princípios, que formam a base do pensamento Espírita sobre a vida e o Universo, que seriam: a existência de Deus; a imortalidade do Espírito; a Reencarnação e a consequente pluralidade das existências; a pluralidade dos mundos habitados e a comunicabilidade dos Espíritos. É bom que se diga que os termos Espiritismo e Espírita, não existiam antes de Kardec, como podemos ver na Introdução de O Livro dos Espíritos, onde Kardec coloca que “para se designarem coisas novas são precisos termos novos” e segue dizendo que “os vocábulos espiritual, espiritualista e espiritualismo têm acepção bem definida”. Kardec ressalta ainda que “o espiritualismo é o oposto do materialismo. Quem quer que acredite haver em si alguma coisa mais do que matéria, é espiritualista”. Daí, então, ele sugere que “em vez das palavras espiritual e espiritualismo, empregamos, para indicar a crença a que vimos de referir-nos, os termos Espírita e Espiritismo”. No Brasil, o Espiritismo teve seu início em Salvador, na Bahia, com a fundação da primeira casa Espírita brasileira, o “Grupo Familiar do Espiritismo”, em 17 de setembro de 1865. E foi no Brasil que o Espiritismo ganhou mais projeção como religião. Os chamados cultos afro-brasileiros surgiram por volta de 1850, trazendo uma mescla de elementos de diversas origens, mas apresentando feições nitidamente africanas como a incorporação pelas divindades orixás e as danças que levam ao êxtase. Segundo o livro “Diversidade religiosa e direitos humanos”, teriam surgido, assim, o Candomblé ou Candomblés, de acordo com alguns estudiosos, devido à grande variedade e matizes com que se apresentam, de acordo coma as nações de origem, como Nagô, Jeje, Angola, Congo entre outros. Alguns são miscigenados, como o Candomblé de Caboclo, que tem influência indígena, mais presente no Nordeste brasileiro. Existe a Macumba, nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, culto esse que também é chamado de Quimbanda. Temos também o Xangô, nome de um culto Nagô, mais presentes em Pernambuco, Paraíba, Alagoas e Sergipe. No Maranhão temos o Tambor de Mina, um culto Jeje e o Tambor de Nagô. Além destes temos a Umbanda, que nasceu no território brasileiro. Esses cultos foram proibidos no início, mas se apresentam hoje como um componente essencial da vida religiosa brasileira. Os negros africanos, ao chegarem ao Brasil durante o período de escravidão, trouxeram um culto primitivo, oriundo de sua pátria, conhecido como Candomblé, que tem como significado “dança com atabaques”. Cultuavam alguns deuses chamados por eles de "orixás". Essas divindades seriam, por um lado, ligadas à natureza e por outro aos homens. O sociólogo francês, que foi professor na Universidade de São Paulo, Roger Bastide, estudou durante muitos anos as religiões afro-brasileiras, chegando a se tornar um iniciado no Candomblé, apesar de ser protestante. Em um de seus livros, As Religiões Africanas no Brasil: Contribuição a Uma Sociologia das Interpenetrações de Civilizações, de 1958, esclarece que o Calundu foi a forma mais urbana do culto africano até o século XVIII, anteriormente ao surgimento das primeiras Casas de Candomblé no século XIX. Calundu seria um espiritualismo afro-brasileiro que incorpora tambores rituais e possessão de espíritos e era praticado principalmente por escravos e seus descendentes nas comunidades mineiras dos séculos XVII e XVIII, ou seja, muito antes do surgimento do Espiritismo. Relatos da época sobre esses eventos revelam um enorme sincretismo religioso. Com a Constituição brasileira de 1824 garantiu-se a liberdade de culto para todas as religiões, desde que as fachadas de seus templos não as identificassem. Com a Abolição da Escravatura e a Proclamação da República, respectivamente em 1888 e 1889, instala-se uma nova ordem político-econômica no Brasil. Roger Bastide esclarece as muitas consequências e interferências desses fatos na vida e no mundo religioso do negro e prossegue descrevendo a organização social dos Terreiros e de dois modelos de ritos, chamados de Nações do Candomblé: o rito jeje-nagô e o angola. No Candomblé um Espírito errante é chamado de "egum" e nos Terreiros de Candomblé, só se manifestam, mediunicamente, as divindades chamadas de "orixás". O chamado Panteão Africano constitui-se basicamente por sete Orixás Maiores e ainda por muitos Orixás Menores. Os primeiros, são voltados para o lado mais divino da obra de Deus e os últimos, são mais ligados à própria criatura humana. Os "orixás", ao presidirem a própria natureza através de seus agentes, trariam em si características de personalidade que os ligariam a determinados estados evolutivos da espécie humana. A vibração provocada pelo tipo de personalidade de um certo indivíduo, vai colocá-lo sob a influência de determinado "Orixá". Diz-se, então, que ele é oriundo daquela faixa psíquica, ou como fazem no Candomblé, que ele é "filho de Santo". O Candomblé, ao desembarcar no Brasil com os escravos, encontrou aqui um outro culto de natureza mediúnica, chamado "Pajelança", praticado pelos índios nativos em variadas formas. Em ambos os cultos havia a comunicação de Espíritos. Os jesuítas, incumbidos de "doutrinar" os índios e depois o negro, proibiram que estes últimos cultuassem seus "deuses" pátrios. Naquela época não havia liberdade religiosa. Os escravos, por não terem outra alternativa, já que os açoites falavam alto, construíam altares com imagens e gravuras dos santos do catolicismo. Nas práticas exteriores, chamavam-nos segundo a vontade dos padres, mas em sua intimidade associavam essas imagens aos orixás que evocavam fervorosamente. Era a única forma de continuarem com suas crenças de origem. Formou-se assim o "sincretismo religioso", ou seja, a associação entre o orixá e o santo da Igreja Católica. Os rituais eram realizados naturalmente nos terreiros das senzalas. Existem mais de 400 orixás na mitologia Iorubá, que é uma região da África composta por diversos grupos étnicos com língua e cultura semelhantes e muitos dos escravos que foram trazidos para o Brasil, vieram dessa região. Tanto o Candomblé quanto a Umbanda cultuam os orixás, no entanto na Umbanda eles são representados com imagens diferentes e, dentre as centenas de orixás, cerca de 70 são cultuados pelo Candomblé e 9 pela Umbanda. Vou apresentar aqui, alguns dos orixás mais cultuados no Brasil, seja pelo Candomblé ou pela Umbanda, lembrando que Olorum, é o Deus maior. Oxalá é o símbolo da natureza religiosa, santificada, ficando abaixo, apenas de Olorum. Na natureza, liga-se aos céus e tudo o que nele há. É sincretizado com Jesus. Iemanjá é símbolo da natureza feminina, da beleza e da reprodução. Na natureza, liga-se às águas do mar. É a protetora das mães e das famílias. No sincretismo seria Nossa Senhora da Conceição ou Nossa Senhora dos Navegantes. Iansã representa a força natural feminina dos ventos e das tempestades e no sincretismo é a figura de Santa Bárbara Xangô é símbolo da sabedoria e justiça, estando envolvido com o cumprimento da lei de causa e efeito. Na natureza liga-se às montanhas e no sincretismo, seria São Jerônimo. Ogum simboliza a ideia de trabalho, de luta, de guerra, de vitória. Na natureza, liga-se aos metais e no sincretismo é São Jorge. Oxóssi é o protetor das matas e dos animais e no sincretismo é São Sebastião. Oxum é o Orixá da fertilidade e do amor, é a protetora das gestantes e da juventude. É a senhora das águas doces, dos rios e cachoeiras. No sincretismo é Nossa Senhora Aparecida ou Nossa Senhora de Fátima. Exú, o mensageiro, responsável pela comunicação entre os orixás e os homens. É o guardião dos caminhos, sendo muitas vezes, interpretado como uma divindade má. Contudo, na mitologia Iorubá não existe a representação do mau. No sincretismo é Santo Antônio. Essa variedade de divindades formam o mundo dos Orixás, dos sentimentos, com o qual cada criatura possui sintonia em determinada faixa, segundo o grau evolutivo que atingiu em sua ascensão espiritual. A origem dos orixás, segundo as lendas do povo africano, é a fragmentação do pensamento criativo, quando este, por sua vontade, vai presidir a criação de determinado orbe. Os orixás não estariam sujeitos à evolução, embora fossem ligados aos Espíritos que o estão, pela afinidade vibratória que os caracterizam. Infelizmente, tudo o que veio da África está atualmente muito diluído, misturado à prática de adivinhações, de magia e de rituais inconsequentes. Entretanto é importante que se compreenda as origens dessa crença a fim de que se tenha uma visão mais completa do que ela representa em nossa cultura. O Candomblé foi de grande importância para a salvação de diversas pessoas que estavam perdidas em sua dor, especialmente nos anos de escravidão e logo depois, no início do século XX. Os cantos, os ritos e o orgulho negro foram entoados pelos escravos através de lindas canções que exaltavam as forças da natureza. Os ritos do Candomblé podem ser matriarcais, quando somente mulheres, as chamadas mães de santo ou Ialorixá, podem assumir a liderança. Podem ser patriarcais, quando a liderança é assumida apenas por homens, os chamados pais de santo ou Babalorixá. Podem, ainda, ser de liderança mista, com a liderança do Terreiro podendo ser assumida por homens ou mulheres. Assim, o universo do Candomblé é muito complicado, uma vez que é constituído de várias tradições africanas, misturadas à tradições luso-indo-brasileiras, o que resultou no sincretismo religioso. Esta junção de elementos de todos os povos e etnias que vieram da África, permitiam cultuar seus Orixás, cada um deles com uma história para sua criação. É o que nos mostra de forma tão bela o fotógrafo franco-brasileiro, Pierre Verger, que também foi etnólogo, antropólogo e escritor, no livro Lendas Africanas dos Orixás, de 1985: Um babalaô me contou: "Antigamente, os orixás eram homens. Homens que se tomaram orixás por causa de seus poderes. Homens que se tomaram orixás por causa de sua sabedoria. Eles eram respeitados por causa da sua força, Eles eram venerados por causa de suas virtudes. Nós adoramos sua memória e os altos feitos que realizaram. Foi assim que estes homens tomaram-se orixás. Os homens eram numerosos sobre a Terra. Antigamente, como hoje, Muitos deles não eram valentes nem sábios. A memória destes não se perpetuou. Eles foram completamente esquecidos; Não se tomaram orixás. Em cada vila, um culto se estabeleceu Sobre a lembrança de um ancestral de prestígio E lendas foram transmitidas de geração em geração, para render-lhes homenagem". Com o tempo, alguns Terreiros começaram a misturar os rituais do Candomblé com os da Pajelança, dando origem a um outro culto chamado "Candomblé de Caboclo". Provavelmente, os Espíritos que se manifestavam eram os de índios e negros, que o faziam com finalidades diversas. Do Candomblé primitivo, restou um tronco original que continuou fiel a suas raízes e que ainda hoje é a melhor linhagem de Terreiros na Bahia e outros Estados do país. O Candomblé de Caboclo, porém, degenerou-se na prática de baixa magia, conjuros, Canjerê, Catimbó, macumba e Quimbanda. Uma mistura de cultos que precisava sofrer a ação do progresso, mas que não poderia ser pela influência da Doutrina Espírita, pois sua natureza abstrata e totalmente despida de rituais, afastava-a de tudo o que os praticantes dessas variantes do Candomblé estavam habituados. A crença do Candomblé é baseada no monoteísmo, embora alguns defendam a ideia de culto a vários deuses, ou seja, alguns consideram o Candomblé como politeísta. No entanto, cada nação do Candomblé cultua apena um deus, que é o senhor de sua cabeça e mente e de quem herda características físicas e de personalidade. É prerrogativa religiosa do pai ou mãe-de-santo descobrir esta origem mítica através do jogo de búzios. Existem três nações candomblecistas e cada uma cultua um deus. A nação Ketu cultua Olorum, a nação Bantu, NZambi e a nação Jeje cultua Mawu. Essas diferentes nações se devem ao fato de os grupos de escravos que vieram para o Brasil, advirem de regiões africanas diferentes. Em 1908, surge na cidade de Niterói, no Rio de Janeiro, a Umbanda, uma genuína religião brasileira. O jovem Zélio Fernandino de Moraes, então com 17 anos de idade, estava apresentando alguns problemas de saúde, que não o permitiam sequer levantar de sua cama. Sua família buscou auxilio de vários médicos, inclusive de psiquiatra e uma curandeira, que o aconselhou a desenvolver sua mediunidade. Um amigo sugeriu leva-lo a um Centro Espírita e no dia 15 de novembro de 1908 ele foi levado até a Federação Espírita do Estado do Rio, em Niterói. Durante a sessão mediúnica, começaram a se manifestar espíritos de caboclos (ancestrais indígenas brasileiros) e de pretos velhos (escravos africanos). O dirigente da sessão mediúnica, alegando que estes eram espíritos "atrasados", pediu que se retirassem. Nisso, uma entidade incorpora em Zélio e se manifesta em defesa das demais. “Se julgam atrasados os espíritos de pretos e índios, devo dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho, para dar início a um culto em que estes pretos e índios poderão dar sua mensagem e, assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome que seja este: Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminhos fechados para mim” Assim, no dia 16 de novembro de 1908, na casa de Zélio de Moraes, em Niterói, se realizava o primeiro culto da religião que viria ser conhecida como Umbanda, com o Caboclo das Sete Encruzilhadas ditando as diretrizes da nova religião: vestir roupas brancas, usar guias de contas coloridas e, entre outras faculdades mediúnicas, priorizar a incorporação de espíritos. Dizendo ainda que acolheriam a todos, como Maria acolheu a Cristo na cruz. Zelio incorporava duas entidades, o Caboclo das Sete Encruzilhadas e o Preto Velho Pai Antônio. Vale ressaltar que o Caboclo das Sete Encruzilhadas foi uma das encarnações do padre jesuíta Gabriel Malagrida, que viveu no século XVIII. O trabalho desse Espírito deu origem a uma linhagem de Terreiros onde não se faziam rituais de sacrifícios, não se olhava sorte; os trabalhos tinham disciplina, com hora para começar e terminar; os adeptos eram convocados ao estudo do Evangelho de Jesus e a fazer a "caridade" junto do povo sofredor. Esse culto deveria misturar-se na mentalidade dominante dos Terreiros já existentes, enfraquecendo-a aos poucos quanto ao primitivismo e fazendo esses trabalhos progredir no mundo das ideias. Segundo seus fundadores, a Umbanda seria a manifestação do Espírito para a prática da caridade e, ao contrário do Candomblé, a Umbanda admite a manifestação de Espíritos errantes, exatamente como no Espiritismo. Alguns Terreiros fazem sessões de desobsessão e até mesmo estudam as obras Espíritas. Numa dissertação de mestrado em História Social, da USP, de 2004 (https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8138/tde-01082003-144126/publico/TdeMarcosCapellari.pdf), que pesquisei, o autor Marcos Capellari, coloca que os elementos formadores da Umbanda já se encontravam desenvolvidos em outras práticas religiosas afrobrasileiras, destacando-se a Cabula, cujo chefe era chamado embanda, assim como a Macumba, cujo chefe era conhecido como Umbanda. Suas origens, pois, remetem ao culto das entidades africanas (orixás, inquices) e indígenas (caboclo), assim como dos santos Católicos. Essa miscigenação de crenças é que deu origem àquela que é considerada uma religião genuinamente brasileira. Vale ressaltar que Macumba é uma espécie de árvore africana e também um instrumento musical utilizado em cerimônias de religiões afro-brasileiras, como o Candomblé e a Umbanda. O termo, porém, acabou se tornando uma forma pejorativa de se referir a essas religiões e, principalmente, aos chamados trabalhos feitos por alguns seguidores. Nas crenças africanas, macumba seria uma variante do Candomblé e o preconceito teria sido gerado porque, na primeira metade do século 20, alguns grupos religiosos consideravam profana essa prática religiosa e passaram a trata-las como “macumba”. E para fazermos uma comparação resumida entre Espiritismo, Umbanda e Candomblé, vamos ver algumas diferenças e semelhanças, resumidamente. Em que se baseia cada uma? O Espiritismo, na continuidade da vida após a morte e a comunicação com os espíritos. Proporciona esperança para a pessoa continuar a viver enfrentando problemas ao saber que a vida continua e que tudo aqui é um grande aprendizado. O Candomblé, no culto aos orixás que através de consultas passadas aos pais de santo pela leitura do jogo de búzios encaminha os homens a uma vida melhor. A Umbanda busca impulsionar os adeptos da Doutrina à evolução através de orientação pela incorporação de espíritos que se apresentam, principalmente, nas formas de Caboclos, Pretos-Velhos e “Crianças”. Surgimento O Espiritismo, na França, codificada por Allan Kardec, a partir da publicação de “O Livro dos Espíritos”, em 1857. O Candomblé é de origem africana e foi trazida ao Brasil através dos escravos. A Umbanda é brasileira, surgindo, através do médium Zélio de Moraes, numa mescla entre Espiritismo, Candomblé, Pajelança e Catolicismo. Há sincretismo com os santos católicos, onde os mesmos são priorizados com suas orações. A comunicação com os Espíritos No Espiritismo se dá através da mediunidade, em diferentes graus. No Candomblé não existe incorporações de espíritos, pois são os orixás que se apresentam. Segundo o Candomblé, o orixá não passa pela vida corpórea como nós. Isto é, os orixás não são entidades como as conhecidas pelo Espiritismo e a Umbanda. O contato com o mundo espiritual é feito através do jogo de búzios. Na Umbanda, ocorre através de médiuns incorporados e, também, pela intuição que é repassada pelos guias. Rituais e Oferendas, como velas, fumo, bebidas, entre outros elementos No Espiritismo não existem. No Candomblé, as oferendas são feitas em nome dos orixás. Na Umbanda, há rituais e oferendas aos orixás e aos guias. Hierarquia Não há uma hierarquia na Casa Espírita, apesar de haver uma distribuição de funções e de cargos de direção, mas não existe uma preparação sacerdotal para se assumir funções dentro de uma Casa Espírita. No Candomblé e na Umbanda, existe toda uma preparação sacerdotal, iniciações, coroações e consagrações. Vestimentas O espiritismo não se prima pela necessidade de uma vestimenta oficializada. O que temos é o costume de algumas Casas Espíritas indicarem o uso de roupas brancas ou claras. No Candomblé e na Umbanda, cada orixá ou cada entidade exige um determinado tipo de roupa e de adereço e quando se vai a um Terreiro, seja de Candomblé ou de Umbanda, é necessário seguir as normas do uso de roupas, geralmente brancas e alguns adereço, de acordo com as particularidades de cada Terreiro. Altar No Espiritismo não existe um altar para atos cerimoniais, no máximo uma mesa onde são realizadas as sessões mediúnicas e onde se realizam alguns estudos. O Candomblé apresenta o Peji, um local sagrado da cultura Afro Brasileira, que seria um cômodo do santo, onde fica o pepelê, um altar onde são cultuados os Orixás, restrito aos filhos da casa, não é permitida a entrada de estranhos. Já na umbanda existe o congá, um ponto de força central da casa, onde as pessoas se dirigem para se relacionarem com o sagrado e onde todos se voltam para ele. Espíritos, Deuses e Orixás No Espiritismo, só há um único Deus e os Espíritos são seres criados simples e ignorantes e através das experiências das diferentes reencarnações, vão evoluindo, até atingirem a perfeição. No Candomblé, os orixás são os grandes representantes das forças da natureza e possuem ligação direta com os elementos água, fogo, terra e ar. Na Umbanda, os orixás são seres mais próximos a Deus, pertencem ao escalão do alto comando espiritual do planeta. Os pretos velhos, caboclos e crianças são espíritos ainda sujeitos a depuração através da encarnação. O termo médium é usado pelo Espiritismo, pelo Candomblé e pela Umbanda e refere-se a um ser encarnado que seria um intermediário entre o mundo físico e espiritual. Ele utiliza sua faculdade mediúnica para estreitar relações entre os dois mundos. Já os termos Mesa Branca e Centro de mesa, são utilizados na Umbanda e designam Centros de Umbanda (os Terreiros, como alguns preferem chamar) com influências Espíritas. Muitos destes Centros ou Terreiros, são regidos pelo estudo da obra de Allan Kardec, contudo sem desmerecer as tradições umbandistas. Já o termo Orixá é utilizado tanto na Umbanda quanto no Candomblé e se refere a uma entidade que está acima dos homens, não reencarnando como ocorre com os demais espíritos. Não existe, seja no Espiritismo, na Umbanda ou no Candomblé, uma tradição escrita nem um livro sagrado, como a Bíblia, a Torá e o Corão. O Espiritismo tem suas obras básicas, que são norteadoras para seus seguidores. Quanto à Umbanda e o Candomblé, eles possuem uma origem comum, nos ritos africanos, e uma tradição marcada essencialmente pela oralidade e pelo aprendizado religioso que se dá através da prática cotidiana nos Terreiros. Então, vamos chegando ao final deste episódio. Eu não busquei aqui fazer um aprofundamento a respeito das três vertentes religiosas, mas sim, trazer algumas informações para que você possa ter uma visão melhor a respeito delas. Para aqueles que ainda têm alguma objeção quanto a algumas práticas, principalmente da Umbanda, deixo como sugestão o livro Loucura e Obsessão, de Manoel Philomeno de Miranda, psicografado por Divaldo Franco e lançado em 1988. O livro mostra uma visita feita por Manoel, a convite do Dr. Bezerra de Menezes, a um Terreiro de Umbanda, onde acompanham os trabalhos ali realizados. O livro nos leva a quebrar muitos conceitos preconcebidos e também alguns tabus relacionados a Umbanda. O livro finaliza apontando algo que os Espíritas conhecem bem, a luminosidade que um ambiente voltado ao bem, emana, sendo visualizada no plano espiritual. “Nas sombras da noite terrestre, a distância, eu podia notar a luminosidade da Casa da Caridade, discreta e até ignorada no mundo, derramando, porém, claridades abençoadas nas sombras espessas.” Este é o podcast Mundo Espiritual e a produção, edição e a apresentação são minhas, Carlos Biella e o Gustavo Crispim é que faz a arte das capas dos episódios. Ouça ou baixe o podcast, confira o conteúdo do episódio e entre em contato conosco pelos endereços que estão na transcrição do episódio (https://podcastmundoespiritual.blogspot.com/ e http://mundoespiritual.podcloud.site/). Estamos também no Facebook (https://www.facebook.com/podcastmundoespiritual), Youtube (https://www.youtube.com/channel/UCvE-E-zthITBCsrNNJa0ytw) e Instagram (https://www.instagram.com/podcastmundoespiritual/). Procure-nos nas diversas plataformas players de podcast. E este é nosso último episódio da temporada 2021. Espero contar com vocês na próxima temporada, que trará novidades para nossos ouvintes. Aguardem... Muitas pessoas, mesmo não se considerando como iniciados seja no Candomblé, Umbanda ou Espiritismo, acabam peregrinando pelas três e por várias outras em busca de conhecimento. Talvez isso seja algo que todos devêssemos fazer. Conhecer as outras religiões, que não a que professamos, pode auxiliar a diminuir a intolerância religiosa. Assim, então, Espiritismo, Candomblé e Umbanda não são a mesma coisa, embora muitos se confundam, devido as semelhanças existentes. São doutrinas conhecidas pelo contato mediúnico com entidades, espíritos e orixás. As três possuem diferenças que parecem mínimas, mas são o que dão a identidade de cada religião ou doutrina. As religiões nos levam a trilhar um caminho, muitas vezes, solitário, voltado, acima de tudo, para o autodescobrimento. Não deveria existir o pensamento de que uma religião tenha a única verdade. O Espiritismo já foi perseguido tempos atrás e hoje vemos nossos irmãos, seguidores da Umbanda e do Candomblé serem perseguidos e muitos de nós, que se dizem Espíritas, nem mesmo comentam a respeito. Lembro aqui que o Brasil é um país laico e existe espaço para todos os tipos de crenças, inclusive espaço para quem não tem crença alguma. E, como ouvi certa vez em um documentário: o meu Deus é o seu Deus, é o Deus de todo mundo, as vezes ele só muda de nome. Para encerar, deixo vocês com Meu Pai Oxalá, com Toquinho e Vinicius de Moraes. Fiquem todos em paz, bom final de ano para todos e até nosso próximo episódio. OKÊ-OLORUM!


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