top of page

MÚSICA DA ALMA # 04 - O LIVRO DE SAN MICHELE

  • Foto do escritor: Carlos A. Biella
    Carlos A. Biella
  • 31 de mai. de 2024
  • 1 min de leitura

ree


O Livro de San Michele.


Existem muitos livros que me tocaram profundamente. Este é um deles. Você conhece O Livro de San Michele? Então, vem comigo.


CONTINUE LENDO...

Sejam bem-vindos, este é o podcast Música da Alma. Eu sou Carlos Biella e a produção, edição e apresentação são minhas e a parte gráfica fica por conta do Hugo Biella.

Acompanhe todos os nossos episódios nas plataformas players de podcasts, procurando por podcast Música da Alma, ou acessando o site www.podcastmundoespiritual.com.br e clicando na aba Música da Alma.


E hoje falarei sobre um livro, mas não um livro qualquer. Em uma das palestras que ouvi de Divaldo Pereira Franco, ele contou uma história intitulada “Flopette, um lírio no pântano”. Segundo ele, esta história teria sido escrita pelo médico sueco, Axel Munthe, em O Livro de San Michele. Após ouvir a história, busquei mais informações a respeito deste livro, lançado em 1929. Acabei ficando meio que fascinado pelo livro e tentei encontra-lo para comprar pela internet, o que acabei fazendo em fevereiro de 2021. A edição que comprei é de 1937, com páginas amareladas e escritas na língua portuguesa daquela época, mas, li o livro com uma voracidade tremenda. Me apaixonei por ele.


Quem vai nos acompanhar hoje é Schubert, um dos compositores preferidos de Axel Munthe. Aqui com a Sinfonia nº 9 em Dó Maior, d. 994, ou, "A Grande", tida como sua obra máxima e a mais pessoal, escrita em 1825. Aqui com a Orquestra Filarmônica de Munique, sob a regência do russo Valery Gergiev.


Em uma das primeiras edições brasileiras, em 1959, os editores dizem: A vida que este médico septuagenário e meio cego conta em retrospecto na sua solidão de San Michele em Anacapri é intensa: desloca-se de Paris a Londres, transporta-nos à Suécia e às regiões desoladas da Lapônia, leva-nos através da Alemanha, abraça a cidade eterna e nos faz presenciar o terremoto de Messina. A narração apresenta uma galeria de grandes e pequenos: vultos da ciência, artistas, príncipes, mulheres boas e más, ricos e pobres, gloriosas e anônimas, gente do povo.


É uma espécie de autobiografia, de uma pessoa incomum. Axel Munthe foi médico, escritor e muitas outras coisas, como político, linguista, colecionador de arte, diplomata e um grande contador de histórias, como podemos ver no livro.

Munthe nasceu na Suécia, em 1857, estudando medicina em Paris, formando-se em 1880, como um dos mais jovens médicos da França. Foi aluno de Charcot, um dos mais importantes Neurologistas e precursor da Psiquiatria.


Trata-se de um livro fascinante, de caráter autobiográfico, onde Axel Munthe, narra suas experiências vividas em muitos lugares, como os citados anteriormente, mas é em Anacapri, na ilha de Capri, que ele constrói a casa de seus sonhos, com ajuda dos moradores locais. É ali que surge a Villa de San Michele, que nomeia o livro.


O livro nos prende pela simplicidade e franqueza de algumas das histórias, como a divertida história do diagnóstico quase obsessivo de colite, que atacava muita gente, naquela época e nem os médicos, nem os doentes sabiam exatamente do que se tratava. Passa pela epidemia de cólera, que matou muitos europeus, numa época que Pasteur ainda investigava a doença.

O livro aborda temas interessantes, como a eutanásia, como sendo uma decisão médica sem qualquer outra interferência.

Também faz grande referência aos animais, com o autor se apresentando como um grande defensor, recolhendo vários deles e dedicando seu livro “a Rainha da Suécia, protetora dos animais maltratados e amiga de todos os cães”, conforme podemos ver na dedicatória do livro.

Quanto a isso, logo no prefácio, Munthe indica seu carinho pelos animais, ao descrever, com sentimento e poesia, o cemitério dos cães, quando diz: quantos amigos mortos tenho ali. Seus corpos corrompidos continuam descansando onde os enterrei, um ao lado do outro, sob os ciprestes, junto à velha torre. Porém, seus corações fieis, subiram as alturas.


Para quem já leu ou irá ler, o livro não segue uma ordem cronológica rigorosa, mas sim uma série de episódios que marcaram a vida do autor, incluindo encontros com figuras históricas como a princesa sueca Victoria, lembrando que Munthe foi médico da família real sueca, o cientista Louis Pasteur e o escritor Henry James, que seria quem o incentivou a escrever esse livro. Mas, são os outros personagens, os mais humildes, como os habitantes de Capri ou as vítimas de cólera em Nápoles, que marcam a narrativa. Desfilam ao longo das páginas, figuras como Maria Portalettere, que subia os 777 degraus fenícios para chegar a Villa de San Michele e entregar a correspondência, o velho Pacciale, o amigo Aracanjo Fusco, a pobre Flopette, entre tantos outros. Independente da classe social, o autor descreve com sensibilidade todos aqueles que cruzaram seu caminho.

Nesta passagem, fica evidente sua veia literária:

Eu era rico e na minha carteira ardia uma vela grossa. Na mesa ao lado ardia a vela mais delgada de toda a aula, porque a mãe do pequeno que estava ao meu lado era muito pobre. Mas, eu fiquei reprovado no meu exame de Natal e aquele pequenito foi o primeiro classificado, porque tinha mais luz no cérebro.


Essa é uma das principais características deste livro, a abordagem humanitária de Munthe, especialmente evidente em sua relação com os animais, do qual ele se coloca como um grande defensor.

Muitos consideram O Livro de San Michele como um “evangelho de bondade”, apesar de mostrar duras realidades vividas pelos personagens narradas ao longo de suas páginas.

Trata-se, enfim, de um testemunho da vida, com todas as suas complexidades e mistérios, e não apenas um relato sobre a morte.

A respeito da morte, tema bem constante na narrativa, Munthe escreve:

Porque pensar na morte? Deus, em sua misericórdia, tornou a Morte invisível para o homem. Sabemos que está junto de nós, como a nossa sombra, que nunca nos deixa. E, no entanto, não a vemos, e quase nunca pensamos nela. O mais estranho é que, quanto mais nos aproximamos do túmulo, mais a Morte se afasta do nosso pensamento. Na verdade, era preciso um Deus para fazer semelhante milagre.


Sem dúvida, é uma leitura envolvente e rica, que oferece uma visão intimista da vida de um homem extraordinário e da época em que viveu, sendo, assim, uma emocionante biografia e uma profunda reflexão a respeito da condição humana.


Ao longo de suas páginas, vemos como Munthe busca a construção de uma casa, usando os escombros de um antigo castelo do imperador Tibério, em Anacapri, na ilha de Capri.

Podemos dizer, ao lermos este livro que Axel Munthe viveu seu sonho, o que o coloca distante da mediocridade da vida comum da maioria de nós.

Este livro é uma delícia para a leitura e, lembro-me de um dos prefácios do livro, onde ele diz: "Não há nada para esquecer a própria miséria como escrever um livro; nada melhor também quando não se pode dormir".


O livro se mostra como uma autobiografia, mas pode e deve, entendo eu, ser lido como um romance, pois podemos sentir a verdade pulsar em suas páginas. Munthe não esconde nada, deixando transparecer suas fraquezas, decepções, episódios de ira, erros cometidos como ser humano e como profissional da medicina e até mesmo relata pequenos delitos cometidos ao longo da vida. Axel Munthe foi um solteirão convicto e o livro não fala de seus amores, mas relata alguns beijos roubados de monjas, em pleno convento. É uma narrativa de vida, com muitos momentos de humor, pois, segundo Munthe, “nem mesmo o próprio diabo pode fazer algo contra um homem que sabe rir”.


Dentre os vários relatos, o livro conta como Axel Munthe ajudou a socorrer as vítimas de um grande terremoto ocorrido na região de Messina, ao sul da Itália, que matou mais de 80.000 pessoas, em 1908.

Outro forte relato é sobre suas atribulações como médico voluntário durante a epidemia de cólera em Nápoles, onde o arroubo da juventude o levou até uma região com intensa proliferação da cólera, infecção intestinal bacteriana, de grande virulência e letalidade, em uma época em que ainda não existia conhecimento suficiente para seu controle.

No capítulo intitulado Nápoles, Munthe conta que escreveu sobre essa sua aventura num livro chamado "Cartas de Nápoles", onde, escreveu o seguinte:

"Tive a audácia de escrever que não tinha medo da cólera nem da morte. Menti. Desde o começo até o fim ambas me causaram um medo horrível. Descrevi na primeira carta como, meio asfixiado pelo ácido fênico no trem vazio, desci de noite na Piazza deserta, como cruzei na rua longas filas de carros e ônibus cheios de cadáveres a caminho do cemitério da cólera; e como passei toda a noite junto dos moribundos nos miseráveis bairros baixos. Mas calei-me sobre o que fiz duas horas depois da chegada; como voltei à estação, me informei ansiosamente do primeiro trem para Roma, a Calábria, os Abruzzos, fosse para onde fosse, quanto mais longe melhor, simplesmente para sair daquele inferno."

Ele só não foi embora assim que chegou a Nápoles, porque não havia nenhum trem saindo da cidade nas próximas horas. O jeito foi encarar a doença e seguir em frente. O livro relata o horror que pairou sobre aquela cidade italiana, com pessoas agonizando e morrendo nos hospitais e nas ruas.

Outro grande medo que Munthe teve em Nápoles foram as ratazanas, vivendo nos subterrâneos da cidade e cumprindo seu papel de devorar tudo o que podia, inclusive as centenas de cadáveres. Segundo Munthe, as ratazanas “estavam quase tão domesticadas como os gatos e eram quase tão grandes como eles”.

O livro traz outras narrativas interessantes, como quando Munthe faz o “contrabando” do cadáver de um sueco, morto na Alemanha, de volta para sua terra natal, ou a descrição de sua viagem a Lapônia.


Velejando de férias pela baia de Nápoles, em 1875, chegou a Ilha de Capri, onde se apaixonou por uma antiga capela, chamada San Michele, em Anacapri, que havia sido construída em meio as ruínas de um antigo palácio do Imperador Tibério, que governara o Império Romano entre 26 e 37 d.C.

Em 1895 ele compra as ruínas de San Michele e passa a construir a casa de seus sonhos, a hoje belíssima Villa San Michele.

Axel Munthe trabalhou por anos para terminar a construção de sua San Michele, uma casa para alma, pois, como ele dizia, “a alma precisa de mais espaço do que o corpo”. Ele faleceu em 1949, aos 91 anos de idade, em Estocolmo, onde vivia como hóspede da família real.

Sua San Michele tornou-se a Villa de San Michele, sendo uma das atrações mais visitadas da Ilha de Capri. Repleta de obras de arte, como um busto do Imperador Tibério.

Uma das peças mais emblemáticas de San Michele é uma esfinge encontrada no mar, após Munthe ter sonhado com ela. Trata-se de uma escultura egípcia, em granito vermelho, de mais de 3.000 anos, representando uma criatura mitológica com rosto de homem e corpo de leão.


Axel Munthe era tão apaixonado pela ilha de Capri, que comprou a área montanhosa atrás de sua Villa, chamada de monte Barbarossa, visando proteger as aves migratórias das redes e armadilhas dos caçadores.

São todas essas histórias encontradas neste exuberante livro e que ainda permanecem vivas na Villa San Michele, nas salas e objetos, no magnifico jardim e na famosa esfinge a olhar o mar e as pessoas, de sua balaustrada, silenciosa e secreta.


Ah, e quanto a história de Flopette que falei no início?

Bem, que quiser, leia o livro e procure no capítulo Regresso a Paris. Ali você encontrará a história relatada por Munthe em conversa com seu amigo Dr. Norstrom.

Agora, caso queiram ouvir a história narrada pela emotividade de Divaldo Franco, inclusive com um desdobramento da história contada por Chico Xavier a Divaldo, procurem na internet ou pelo link que deixei na transcrição deste episódio (https://www.youtube.com/watch?v=OupYJUTJrc0&t=499s&ab_channel=VidaAl%C3%A9mdaVida).

Axel Munthe nos mostra, ao longo de centenas de páginas, como a atuação de um médico pode definir o rumo na vida de um doente. “As palavras de um médico podem custar a vida de seu paciente (…) Crianças com escarlatina não precisam de medicação; basta cuidar bem deles e ter um brinquedo para a longa convalescença. Há muito que eu aprendi a incluir bonecos de madeira e cavalos na minha farmacopeia”.


Ao terminar de ler O Livro de San Michele, podemos entender como o ser humano é movido pela esperança, como deixou bem claro Axel Munthe: “não há remédio tão poderoso como a esperança, e que o menor sinal de pessimismo no rosto dum médico pode custar a vida ao doente”.

É um livro de leitura vital, que nos prende ao longo dos relatos e que poderia ser utilizado como norteador para os profissionais da medicina, que lidam com dor, sofrimento, tristezas e alegrias, mas, que, acima de tudo, lidam com a vida e a fragilidade de seres humanos. Afinal, como diz Axel Munthe no prefácio, “o livro de San Michele é o livro da vida”.


Este é o podcast Música da Alma e eu sou Carlos Biella e a produção, edição e apresentação são minhas e a parte gráfica fica por conta do Hugo Biella. Acompanhe todos os nossos episódios nas plataformas players de podcasts, procurando por podcast Música da Alma, ou acessando o site www.podcastmundoespiritual.com.br e clique na aba Música da Alma. Acesse meu canal no Youtube e confira diversos vídeos e palestras. Procure por Carlos Biella, inscreva-se e nos siga.

Música da Alma, um podcast pra te provocar emoções.


Ao finalizar este episódio, lembro-me do início do livro. Ainda no prefácio, Axel Munthe conta como escreveu esta obra, supostamente recebendo a visita de seu eu, como um rapaz que se instalara em frente sua escrivaninha e começara a falar sobre sua vida. Ao final do prefácio, Munthe lhe diz para ir embora e lhe deixe continuar em paz a história de San Michele e a descrição dos seus preciosos fragmentos de mármore do solar de Tibério.

Então, o rapaz teria lhe dito: “pobre velho, o senhor não diz senão tolices. Não foi acerca de San Michele, nem dos seus preciosos fragmentos de mármore que animou centos de páginas, mas apenas com fragmentos de argila, extraídos de entre os pedaços da sua vida partida”.


São livros assim que nos dão prazer em ler.

Fiquem todos bem e até nosso próximo episódio.


2 comentarios

Obtuvo 0 de 5 estrellas.
Aún no hay calificaciones

Agrega una calificación
Ilton Lima
Ilton Lima
01 jun 2024

Interessante!

Me gusta
mundoespiritual05
01 jun 2024
Contestando a

Obrigado pelo retorno. O livro é muito gostoso de ler.

Me gusta
bottom of page